sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O mal que é a mesmice

O mundo não é só isso né?
Medo dos limites, das fronteiras, das pessoas, de pensamentos uniformes.

Eu quero mais, mais e cada vez mais.
Me cansa a mesmice, me cansa cansar da mesmice.
O controle da situação me entedia.

(Autor da Frase: Jorge Vieira - Minha Monete)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Algo que não sei o que é

Sempre foi assim,
e foi aos 7 que eu descobri que era assim.
De lá até hoje continua sendo,
e por dentro tudo corroendo.
Sei que é, mas o que é eu não sei.
Sequer faço idéia do que isso venha a ser, mas são 33 anos já vividos,
alguns deles muito sofridos,
e a maioria deles não teve sentido.
O nome disso nenhum dicionário me deu,
a quem perguntei ninguém respondeu,
dentro de mim isso sempre doeu,
nenhum médico sabe o diagnóstico. Então não há cura?
Procurei em todas as coisas,
estudei quase todas as coisas,
experimentei o que até onde a coragem deixou,
tentei o que pude.
Não sei de que é excesso, nem de que é escassez.
Não passa, e a cada dia fica pior. Me extravio de mim mesma.
Estou aqui agora, mas o pensamento não. Ele está sempre perdido.
Digo perdido porque aonde quer que ele esteja, ele não se encontra. Ele nada encontra.
Ao que me parece, é um tudo que ao mesmo tempo não é nada,
uma busca pelo o não sei o quê, indo não sei para onde.
Nada preenche,
nada é suficiente,
nunca é plenamente,
mas tudo consome,
e esse tudo que consome não tem nome.
Levito num eterno buraco negro, não chego a lugar algum,
nada vejo a frente, nada ouço, nem mesmo o eco da minha voz.
Não! Nada ocupa o espaço,
nada preenche o vazio,
e a alma sentindo frio.
Sensação latente de algo pendente,
coração falando de algo faltando,
uma metade está perdida,
ou eu totalmente perdida?
Não! O meu peito é um imenso abismo,
nele me atirei, ainda estou em queda,
sentindo aquele frio na barriga,
esperando chegar ao chão.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Pelo menos...

A minha felicidade está tão distante quanto aquela estrela que brilha no céu. Pelo menos a estrela eu ainda consigo ver.
A minha tristeza é tão profunda quanto este mar. Pelo menos, se eu mergulhar bem fundo neste mar, eu encontro, lá embaixo, uma vida real, harmônica e que vale mais a pena do que esta que eu vivo.
As minhas perspectivas diante da vida são tão escuras quanto a noite. Pelo menos a noite conta sempre com a ajuda da lua para ter um pouco de luz.
As minhas lágrimas são tão densas e devastadoras quanto as chuvas de verão. Pelo menos as chuvas são passageiras e, em algumas vezes, ao final delas, ainda é possível contemplar as cores do arco-íris.
Os meus sonhos esvaem-se entre meus dedos como os grãos de areia da praia, e que o vento vem e leva tudo como se fosse pó, deixando um imenso vazio. Pelo menos os grãos de areia cumprirão seu papel diante da vida formando lindas dunas em outro lugar. Terão várias formas, formarão outras imagens, redesenharão outras paisagens, tudo conforme a direção que o vento der, tudo conforme a oportunidade que o vento assim proporcionar.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Asas

Quem me dera ter asas! Sumiria no mundo!
Sentiria o vento no meu rosto,
sentiria o frescor da brisa.
Viria tudo lá de cima tão pequeno
e pra mim tudo seria tão pequeno,
menos a imensidão do universo.
Me perderia no céu,
me encontraria em mim mesma,
vazia de tudo, mas cheia só de mim,
completamente completa.
Flutuante no ar,
leve, solta, livre,
pés no chão da vida.
Igual a uma árvore, raiz na terra,
mas dando frutos e flores.
Repleta de perfumes, cores e sabores.
Eu com-migo, sem risco e sem perigo.
Livre, sem destino,
nem juízo, nem tino.

Diálogo entre mãe e filha

- Ai! (suspiro) Meu Deus, que saco!
- O que foi? Você faz isso toda hora. Tá com dor de cabeça de novo?
- Minha vida é uma dor de cabeça.
- Eu já falei pra você ir ao médico, se tratar. Tem que ver o que é isso. Tá muito nova pra ficar sentindo essas coisas.
- A MINHA VIDA É uma dor de cabeça!
- Por que você fala essas coisas? Você fala demais, parece velha, fica resmungando pelos cantos, e sem razão. Por que você fala assim?
- Eu não sou feliz, mamãe. Não posso negar isso, não posso negar que sou infeliz. Não estou nada satisfeita com a vida que levo. É isso. Simples e ridículo desse jeito!
- É? Vai se fazer o quê então?
- Mudar, né.
- Mudar pra onde? Eu nem sei mais o que falar com você não, minha filha. Você é toda estranha, só fala besteira. Mudar como? Você não tem dinheiro, não trabalha de carteira assinada, ganha pouco, eu não tenho dinheiro pra te dar...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Entre "por que" e "porque"

Todo dia eu vendo parte da minha alma atrás de um "por que de...?".
Quase todo dia eu me resgato, me salvo num "porque...". Ás vezes me suicido num "por que?" sem "porque..." E assim, meu martírio se perpetua.
Entre "por que's?" e "porque's..." eu sorrio e choro, me perco e me encontro, desanimo e desejo. Bato a cabeça na pedra, sangro, morro e ressuscito.
Quero respostas para as minhas perguntas, quero saber em que realmente eu acredito.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Monete

Depois que Monete chegou
A minha vida mudou
Meu dia rejuvenesceu
Depois que Monete apareceu
Ele me fez esquecer um pouco da dor
Monete encheu meu peito de amor
A gente senta, conversa e se diverte
Monete é cor de chiclete
Ele preenche o vazio, ocupa os espaços
Me ajuda a juntar meus pedaços
Quando Monete chega, tudo logo se agita
Monete não anda, ele saltita
Monete ouve Bethânia e se alucina
E por onde vai, jorra purpurina
Monete tem a alma colorida
É meu amigo pro resto da vida.
Monete? Adoooooooro!

domingo, 8 de agosto de 2010

Minha boca

Minha boca fala, e não mente
Põe fora tudo o que meu coração sente
As palavras saem fortes, embaladas num sarcasmo obsceno
Como flecha sem direção, lança encharcada de veneno
Firo, eu sei, machuco sim
Mostro as gotas de sangue que saem de mim

domingo, 11 de julho de 2010

Saudade

Ai! Que saudades eu sinto
Daquilo que eu nunca tive
Que vazio isso me deixa
Que dor isso me causa
Consome, mata aos poucos
Cortando a frio
Ferindo a carne
Doses diárias de sofrimento
A alma em descontentamento
Saudade
Ficar só na vontade
Solidão, minha única verdade
Dor que me causa tormento
Do inferno ao firmamento

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Febre

É uma febre.
Por que é intensa e passageira?
Não, é uma febre porque arde, queima.
Deixa o corpo quente todos os dias.
Em alguns momentos a temperatura é de 37 graus, em outros é de 41.
Apesar disso, o coração está sempre frio.
Vivendo todos os dias a zero grau,
Num inverno praticamente Antártico,
Gelado e deserticamente vazio.
Faça chuva ou faça sol,
Noite ou dia,
Inverno ou verão,
As horas correm,
Passa o tempo,
Mas a febre não passa.
E o corpo numa situação insustentável,
E o coração cada vez mais inabitável.

Quase desconhecida

Não sei até onde parte do que escrevo é autobiográfico, até porque eu não sei direito quem eu sou.
Não me conheço o suficiente para me descrever bem. Confesso que para lembrar a minha fisionomia, eu recorro ao espelho sem vergonha nenhuma. E mesmo assim, ainda fico em dúvida se aquela imagem refletida sou eu mesma.
Quando me dá na veneta, eu me busco, me vasculho por dentro e por fora na intenção de obter mais informações sobre essa pouco conhecida EU.
Sempre comparando a recente vasculhada com a anterior, em algumas vezes eu encontro algo a mais dentro de mim, algo que eu não tinha reparado antes; em outras, dou falta do que tinha certeza de que ainda estava alí.
Nesse busca-busca de mim mesma, vou adicionando e subtraindo características de acordo com as minhas experiências ao decorrer da minha vida. Consigo ser diferente e previsível e igual e imprevisível em vários momentos de um mesmo dia. Como eu sou volúvel, né?!
E assim eu sigo transitando no que fui, no que estou sendo agora e no que serei depois. Vou aprendendo e amadurecendo, brincando de ser eu e sendo várias e uma só ao mesmo tempo.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

A Mulher No Espelho

A mulher se olha no espelho
ela quer se conhecer,
quer se reconhecer.
Saber o que restou do passado,
saber o que sobrou para o futuro.

A mulher se olha no espelho
e nota que carrega no corpo as marcas do tempo,
carrega na alma as marcas da vida.
Ela não é a mesma de antes,
tem o rosto cansado e as mãos envelhecidas.

A mulher se olha no espelho
vê os fios brancos evidentes em sua cabeça
e os atribui aos tormentos que viveu.
Lembra dos choros que conteve
e dos choros que não conteve só, em seu quarto, em silêncio,
enquanto fingia que dormia.

A mulher se olha no espelho
e sente saudades de tudo o que não viveu,
se desespera.
Se dá conta de tantas coisas que perdeu,
das oportunidades que deixou passar,
de tudo o que ficou para trás e que o tempo não trará mais.

A mulher se olha no espelho
vê olheiras enormes
sente a flacidez da pele
repara as rugas,
sua juventude já se foi.
O corpo sofreu o peso da vida.

A mulher se olha no espelho
fecha os olhos e lembra o passado.
Analisa a vida
e faz a contabilidade.
Conta as perdas e os ganhos,
o seu balanço: dores, desilusões.

A mulher se olha no espelho
se despe,
observa cada parte do seu corpo
não gosta do que vê
sua beleza se perdeu
e chorando, ela se contenta.

A mulher deixa o espelho por um momento
e vai tomar um banho quente,
se esfrega bem
como se lavasse toda a sujeira que sente
como se suas lembranças pudessem descer pelo ralo
assim como a água que cai de seu corpo.
Ela está mais leve agora.

A mulher volta ao espelho
decide esquecer tudo
marca o dia de hoje como um início de uma nova vida.
O tempo não volta para o corpo, mas recomeça para a alma,
alma que rejuvenesce,
e o sorriso renasce
e o futuro floresce.

A mulher se olha no espelho
se vê, se enxerga como nunca antes
se diz mulher, se acha bonita, está viva!
Ela se toma, se sente, se ama.
Ela se pertence, agora ela é só dela.
E vai em frente, toma as rédeas da vida,
planeja o futuro.
Não sabe se vai ser feliz, mas sabe que ainda tem vida,
e vai vivê-la plenamente.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Sabedoria Repentina

"Nada como esquecer da vida em certas ocasiões."

Frase dita por Isabel (Maria José de Souza), minha amiga e empregada doméstica de onde trabalho, ao comentar com ela que eu gosto de tomar uma cervejinha pra fingir esquecer dos problemas.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Proponho Um Brinde

Proponho um brinde, dois brindes, três brindes...
Não para comemorar
É brindar só para beber
Beber para não lembrar
Beber para esquecer.
Sentir o corpo anestesiar
E a alma entorpecer
Até parar de chorar
Até parar de sofrer.
E um sorriso encenar
E toda lágrima esconder
E por instantes me enganar
Que a dor não vai mais doer.

sábado, 17 de abril de 2010

L.I.V.R.O.

Um novo e revolucionário conceito de tecnologia de informação

Na deixa da virada do milênio, anuncia-se um revolucionário conceito de tecnologia de informação, chamado de Local de Informações Variadas, Reutilizáveis e Ordenadas - L.I.V.R.O.

L.I.V.R.O. representa um avanço fantástico na tecnologia. Não tem fios, circuitos elétricos, pilhas. Não necessita ser conectado a nada nem ligado. É tão fácil de usar que até uma criança pode operá-lo. Basta abri-lo!

Cada L.I.V.R.O. é formado por uma seqüência de páginas numeradas, feitas de papel reciclável e capazes de conter milhares de informações. As páginas são unidas por um sistema chamado lombada, que as mantêm automaticamente em sua seqüência correta.

Através do uso intensivo do recurso TPA - Tecnologia do Papel Opaco - permite-se que os fabricantes usem as duas faces da folha de papel. Isso possibilita duplicar a quantidade de dados inseridos e reduzir os seus custos pela metade!

Especialistas dividem-se quanto aos projetos de expansão da inserção de dados em cada unidade. É que, para se fazer L.I.V.R.O.s com mais informações, basta se usar mais páginas. Isso, porém, os torna mais grossos e mais difíceis de serem transportados, atraindo críticas dos adeptos da portabilidade do sistema.

Cada página do L.I.V.R.O. deve ser escaneada opticamente, e as informações transferidas diretamente para a CPU do usuário, em seu cérebro. Lembramos que quanto maior e mais complexa a informação a ser transmitida, maior deverá ser a capacidade de processamento do usuário.

Outra vantagem do sistema é que, quando em uso, um simples movimento de dedo permite o acesso instantâneo à próxima página. O L.I.V.R.O. pode ser rapidamente retomado a qualquer momento, bastando abri-lo. Ele nunca apresenta “ERRO GERAL DE PROTEÇÃO”, nem precisa ser reinicializado, embora se torne inutilizável caso caia no mar, por exemplo.

O comando “browse” permite fazer o acesso a qualquer página instantaneamente e avançar ou retroceder com muita facilidade. A maioria dos modelos à venda já vem com o equipamento “índice” instalado, o qual indica a localização exata de grupos de dados selecionados.

Um acessório opcional, o marca-páginas, permite que você faça um acesso ao L.I.V.R.O. exatamente no local em que o deixou na última utilização mesmo que ele esteja fechado. A compatibilidade dos marcadores de página é total, permitindo que funcionem em qualquer modelo ou marca de L.I.V.R.O. sem necessidade de configuração.

Além disso, qualquer L.I.V.R.O. suporta o uso simultâneo de vários marcadores de página, caso seu usuário deseje manter selecionados vários trechos ao mesmo tempo. A capacidade máxima para uso de marcadores coincide com o número de páginas.

Pode-se ainda personalizar o conteúdo do L.I.V.R.O. através de anotações em suas margens. Para isso, deve-se utilizar um periférico de Linguagem Apagável Portátil de Intercomunicação Simplificada - L.A.P.I.S. Portátil, durável e barato, o L.I.V.R.O. vem sendo apontado como o instrumento de entretenimento e cultura do futuro. Milhares de programadores desse sistema já disponibilizaram vários títulos e upgrades utilizando a plataforma L.I.V.R.O.


(Texto de Millor Fernandes)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Dois menores e MELHORES contos de fadas do mundo!



Conto de fadas para mulheres do séc. 21 - I


Era uma vez uma linda moça que perguntou a um lindo rapaz:

- Você quer casar comigo?

Ele respondeu:

- NÃO!

E a moça viveu feliz para sempre. Foi viajar, fez compras, conheceu muitos outros rapazes, visitou muitos lugares, foi morar na praia, comprou outro carro, mobiliou sua casa, sempre estava sorrindo e de bom humor, nunca lhe faltava nada, bebia cerveja com as amigas sempre que estava com vontade e ninguém mandava nela.
O rapaz ficou barrigudo, careca, o pinto caiu, a bunda murchou, ficou sozinho e pobre, pois não se constrói nada sem uma MULHER.



FIM



Conto de fadas para mulheres do séc. 21 - II

Era uma vez, numa terra muito distante, uma linda princesa independente e cheia de auto-estima que, enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo estava de acordo com as conformidades ecológicas, se deparou com uma rã.
Então, a rã pulou para o seu colo e disse:

- Linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Mas uma bruxa má lançou-me um encanto e eu transformei-me nesta rã asquerosa. Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir um lar feliz no teu lindo castelo.
A minha mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavarias as minhas roupas, criarias os nossos filhos e viveríamos felizes para sempre...

E então, naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã à sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria e pensava:

- Nem fo....den...do!


FIM

(Luís Fernando Veríssimo)

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Soneto da dor

Á dor, já me acostumei
Sofrer não me causa espanto
Estou imune ao pranto
De tantas tristezas que passei.

Estou farta de ter esperança
À vida não peço mais nada
Não espero em pé nem sentada
Por aquilo que nunca me alcança.

A DEUS cansei de pedir
Que meu choro faça calar
E a dor não mais doer.

Então devo admitir
Que só a morte fará cessar
Essa vida de sofrer.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Sonhos roubados

É surpreendente como coisas que me fizeram falta quando eu era criança ainda conseguem me fazer falta na vida adulta.
Mesmo depois de tantos anos, sinto na boca o doce e o amargo da minha infância como se tudo tivesse acontecido ontem.
Esses dias, andando pela Central do Brasil, um brechó me chamou a atenção. Tinha na vitrine dois objetos, um vestido e um tênis, que me trouxeram a lembrança de dois sonhos infantis que eu não realizei: dançar quadrilha e usar Kichute.
Lembrei que sempre quis dançar quadrilha ouvindo o bom e velho Gonzagão, usar aquela roupa comprida, colorida e cheia de enfeites. Mas meu pai não me deixava dançar para não ter que gastar grana à toa. Ele não queria "jogar dinheiro fora" comprando um vestido pra dançar só numa noite na escola. O dinheiro não foi jogado fora, mas o meu sonho...
Eu adorava. Todas às vezes que começavam os preparativos para a festa junina, eu me inscrevia. Ensaiava até o último dia, na esperança de que ele mudasse de idéia. Como isso nunca acontecia, eu dançava em todos os ensaios, mas, na grande noite, eu não aparecia.
Na aula seguinte, eu chegava inventando uma história triste ou catastrófica para justificar a minha falta na festa.
Ás vezes, sozinha, sonhando acordada, fecho os olhos e me vejo dançando com um vestido enorme e bem rodado, girando uma sombrinha de Sinhazinha ao som de Frevo Mulher na voz de Amelinha, um clássico das quadrilhas. Que deleite! Imaginário, prazeroso e solitário.
E o Kichute? Podem falar o que quiserem dele, mas eu era doida pra usar aquilo.
Minhas colegas de classe usavam com meia branca dobradinha e com o cadarço preso ao tornozelo. E eu achava lindo.
Uma vez, pedi a uma colega que trocasse comigo, na hora do recreio, o kichute dela pela minha Melissa (que eu detestava). Só para ter, pelo menos uma vez, sensação daquele tênis no meu pé. Quando o sinal tocou, a hora do recreio terminou e o meu sonho acabou.
Minha mãe nunca quis que eu usasse um Kichute, e por isso, nunca o comprou. Ela achava que ele era muito feio. "Isso é coisa pra garoto. Menina tem que usar Melissa. Eu acho mais bonito"
Pelo fato de o conceito de bonito dela ser diferente do meu, o meu sonho ficou só no sonho.
Enquanto escrevia isso, me lembrei do Pogobol. Caraca! O Pogobol da Estrela! Como eu queria pular com aquilo, eu sonhava em ter um amarelo. Nossa!
Quando pedi um pro meu pai, ele disse que eu poderia cair, me machucar e ficar com o corpo cheio de marcas de feridas, que ele chamava de "reloginho".
"Você vai cair, se machucar, ficar cheia de reloginho. E quando crescer, vai ficar feia e ninguém vai querer casar contigo. Depois vai ficar por aí chorando, velha e solteira."
É, pai. Como se não casar fosse um péssimo destino. Esses sonhos não realizados me causam mais sofrimentos do que a solteirice que eu vivo hoje. Não tenho nenhum reloginho pelo corpo e mesmo assim não casei. E duvido que marido algum seria mais interessante, que me faria mais feliz do que o Pogobol.
Ah, meus sonhos! Doces sonhos que me foram roubados!
E pra compensar essa tristeza e essa nostalgia, aqui vai uma música que cantarolei a minha infância inteira, e que quando canto, traz ao meu peito, saudades de lembranças felizes.